Nenhum ato terrorista pode ser tolerado. Há que se lutar com todas as forças para que atentados sejam riscados da história. Pronto, deixando isto bem claro, creio que podemos adentrar no movediço terreno das dúvidas e questões surgidas a partir da morte de Bin Laden. Afinal, como há tempos alertou a filósofa alemã Hannah Arendt, na obra “Eichmann em Jerusalém”, um relato sobre a banalidade do mal, pensar é preciso.
Já na época dos ataques de 11 de Setembro, o mundo que, no início se solidarizava com as vítimas americanas, mudou de rumo. A partir da fúria da intitulada guerra contra o terror, onde mais vítimas inocentes foram mortas no Afeganistão e Iraque e com a qual se acentuou o preconceito ocidental para com as milenares culturas do oriente, muitas pessoas passaram a olhar com indignação para os EUA.
Recusando-se a ratificar o Estatuto de Roma, posto que não queriam se ver acusados de crimes de guerra, os EUA, com sua força econômica e militar, mais uma vez demonstravam o desrespeito para com os direitos humanos, inclusive buscando suspeitos no mundo todo, retirando-os de seus lares e detendo-os na base de Guantánamo, sem advogado e contato com a família. Isto não foi bem recebido entre os não-cidadãos americanos, ou seja, pelo resto do mundo. Passados dez anos do ataque, a Casa Branca capitaneou a invasão do Paquistão, ceifou qualquer resquício de respeito à soberania, protagonizou a ofensiva no esconderijo de Bin Laden, matou-o e jogou seu corpo no mar, nos moldes da ditadura argentina da segunda metade do século passado. O noticiário imediato foi bastante curioso. A TV transmitia as declarações do governo americano e da União Europeia (UE), que em única voz afirmavam que o mundo tinha ficado mais seguro. Em seguida, porém, passavam a anunciar que os EUA e UE elevavam o nível de perigo de ataque terrorista.
É óbvio que o mundo não amanheceu mais seguro. A forma como Bin Laden foi preso e morto será o nascedouro de hordas de seguidores, mais fundamentalistas e mais perigosos. A atitude americana aprofunda o choque de civilizações e fomenta a intolerância. A esta altura, parece que esquecemos as lições de Sérgio Vieira de Mello, ex-alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, morto em 2003, vítima de atentado em Bagdá, para quem a conquista da paz está muito mais ligada à empatia entre vencedores e vencidos do que propriamente à força. Pensar é preciso.
Fonte: Jornal A Notícia de 11/05/2011 (http://www.clicrbs.com.br/anoticia/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a3306494.xml&template=4187.dwt&edition=17081§ion=892)