sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Eleições 2012 – o voto dos presos, por João Marcos Buch*

Sim, todo preso provisório, que não sofreu condenação definitiva, tem o direito constitucional ao voto – respondi eu a um aluno que perguntou se o preso tinha direito a votar nas eleições. A turma havia concluído que a invisibilidade das violações que ocorriam no interior dos presídios era resultado da falta de atenção do Estado e da sociedade. Assim que dei a resposta, em contrapartida, sabia que ia acontecer. O aluno, com a indignação que a juventude estudantil tem, questionou:

“Então, por que os presos provisórios em Joinville não votam, já que têm este direito?” E outra vez a lógica pragmática e certeira do estudante apontava o dedo na ferida. O direito ao voto do preso provisório ficou estabelecido há 24 anos, na Constituição Federal (art.15). No Brasil, são por volta de 40% a 50% dos cerca de 500 mil presos que estão nessa condição, presos provisórios, e que por isso têm o direito ao voto. Mas apenas um percentual pequeno e poucos estabelecimentos prisionais permitem o seu exercício. Com cerca de 500 presos provisórios (outros mil cumprem pena), Joinville acompanha o restante do País, ou seja, não haverá acesso ao voto no próximo dia 7 de outubro.

É claro que não faltam afirmações do tipo “estão querendo dar direito aos piores da sociedade, aos que estão presos”. São frases tão preconceituosas quanto insípidas. O tempo dos debates a respeito já foi superado. O direito constitucional ao voto existe e cumpre implementá-lo. Se a lei é cumprida para encarcerar, então que se a cumpra também quando vem em prol do encarcerado. Uma nação, já disse Mandela, não pode ser julgada pela maneira como trata seus cidadãos mais ilustres, mas sim pelo tratamento dado aos marginalizados: seus presos. É um raciocínio claro. É a lei da ação e reação. Respeite e será respeitado, confira um tratamento digno ao preso, e a vida fora da prisão, para todos, será mais tranquila, mais pacífica. Efetivar o voto dos presos provisórios assim é reconhecer a dignidade dessas pessoas, conferindo-lhes respeito. É fazer com que as violações que sofrem transponham as cortinas do descaso, venham a público e passem a ser tratadas com a devida importância.

Já tive oportunidade de dizer que quando se ensina a teoria dos princípios constitucionais e as garantias deles decorrentes é comum ouvir que a realidade das ruas é outra, dissociada dos mais básicos direitos. Acaba-se, então, por concluir que o plano das ideias não corresponde ao plano real, com abandono de ações que visem a fazer valer os direitos fundamentais. Porém, é possível fazer o contrário, acreditando na política como fenômeno de transformação e evolução da sociedade, com ações concretas próprias de um Estado democrático de direito, destinadas a compensar situações de injustiça social.

Não será desta vez que os presos provisórios de Joinville votarão, mas que seja a última vez que esse direito lhes seja negado. Dificuldades existem, porém são superáveis, basta pressão popular e vontade política. E o Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, exemplo de eficiência para o País, já se empenha nesse sentido.

Como juiz da execução penal, espero conseguir ver todos em 2014 votando para deputado estadual e federal, senador, governador e presidente. E mais um salto ético a sociedade dará. Foi o que respondi ao estudante e a mim mesmo.


*juiz de direito e conselheiro executivo da Associação Juízes Para Democracia (AJD)

Fonte:  http://www.clicrbs.com.br/anoticia/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a3907084.xml&template=4187.dwt&edition=20547&section=2595