terça-feira, 17 de março de 2009

Defensoria Pública em Santa Catarina: descumprimento contumaz da Constituição Federal

Alessandro da Silva*


Na última sexta-feira, dia 13 de março, o Movimento pela Criação da Defensoria Pública no Estado de Santa Catarina realizou uma reunião na sede da CNBB em Florianópolis, na qual estiveram presentes várias entidades que participam desse esforço, como Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina, Cáritas, Pastoral Carcerária, diretórios acadêmicos, Associação dos Defensores Públicos da União, Movimento Nacional de Direitos Humanos, Movimento de Mulheres e Associação Juízes para a Democracia.
O objetivo era expor o cronograma de atividades para o ano de 2009 e demonstrar aos presentes a necessidade urgente de instalação da Defensoria Pública e insuficiência do modelo de defensoria dativa adotado em nosso Estado
No dia anterior, em 12 de março, durante a cerimônia de abertura do Colégio Nacional de Presidentes de Seccionais da OAB na sede da Subseção de Blumenau, o Governador Luiz Henrique da Silveira condenou iniciativas de entidades no sentido de implantar uma Defensoria Pública que, além de isoladas, representariam um retrocesso. Destacou ainda que “advogados dedicados em todo o estado integram uma imensa, atomizada e disseminada rede de atendimento jurídico”, em clara referência à defensoria dativa.
Equivoca-se, contudo, o Governador, pois a Defensoria Pública é uma modelo totalmente distinto da defensoria dativa.
De imediato, observe-se que a instalação da Defensoria Pública não é uma opção atribuída aos Estados, mas uma obrigação imposta pelo art. 134 da Constituição Federal.
A Constituição de 1988 adotou um modelo de assistência jurídica aos que não podem pagar um advogado por meio da criação de uma instituição, a Defensoria Púbica, que tem por função a orientação, a informação e a defesa judicial. Não se trata de mera atuação em processo judicial, pois além disso também há o papel preventivo. Essa instituição goza de autonomia funcional e administrativa, o que lhe permite inclusive atuar em face do Poder Público.
Já a defensoria dativa, como observou o Governador, é uma atividade pulverizada, sem uma diretriz de atuação definida, que se limita à assistência judiciária, já que os advogados somente recebem seus honorários do Estado se ajuizarem um processo.
Uma vez instalada a Defensoria Pública, seus quadros devem ser preenchidos com servidores públicos concursados, os defensores públicos, organizados em carreira e titulares de garantias, como a inamovibilidade, que dedicarão todo seu tempo e sua vida profissional à missão de orientar e defender os necessitados.
A defensoria dativa, em regra, é prestada por advogados em início de carreira, muitas vezes inexperientes, e que abandonam a atividade assim que conseguem se estabelecer profissionalmente e se estabilizar financeiramente. Assim, a assistência serve como uma espécie de laboratório para os novos advogados, o que pode ser causa de déficit técnico nas defesas.
No que tange ao argumento de que a Defensoria Pública não atingiria toda a população que dela precisa, vale observar que é obrigação do Estado prover os meios necessários para que a instituição cumpra esse objetivo, sendo que, caso não alcançado, a responsabilidade será do Estado.
Por fim, no que concerne à alegação de que a instalação da Defensoria Pública teria um custo mais elevado que a defensoria dativa, é de se destacar que isso nunca foi efetivamente comprovado pelo Governo Estadual. De todo modo, a questão financeira não pode ser óbice ao cumprimento da Constituição Federal. Não se olvide ainda que vários outros Estados que têm arrecadação bem inferior já instalaram a Defensoria Pública, enquanto Santa Catarina permanece como o único que ainda não o fez.
Como se percebe, o Estado de Santa Catarina insiste em descumprir o mandamento constitucional, subtraindo dos indivíduos uma das garantias fundamentais para exercício pleno da cidadania. Diante de omissão tão grave, mais uma vez é hora de a sociedade catarinense se organizar para exigir a instalação da Defensoria Pública, único modo de assegurarmos o respeito ao Estado Democrático de Direito.

* Juiz do Trabalho e membro do conselho executivo da Associação Juízes para a Democracia