João B. Damasceno*
A capacidade de o Judiciário resolver conflitos do mundo político tem sido interpretada como geradora de tensão ou elemento das democracias. Trata-se da judicialização da política e sua origem remonta a 1803 quando a Suprema Corte dos Estados Unidos negou aplicação a lei que contrariava a Constituição.
As leis, embora elaboradas por representantes do povo, o são por um poder constituído e, se contrariarem a Constituição, não podem ser aplicadas, pois no conflito da lei com a Constituição esta há de prevalecer. No Brasil, somente viemos a conhecer tal possibilidade com a constituição republicana em 1891. Antes, a assinatura do imperador eliminava os vícios da lei.
Na República, Ruy Barbosa teve grande dificuldade de fazer com que o Judiciário compreendesse seu poder de declarar inconstitucionalidade de leis ou de resolver, com base nelas, conflitos políticos. E muitos ainda não compreenderam. O impedimento de análise, pelo Judiciário, de conflitos envolvendo interesses políticos sempre foi o bordão das ditaduras.
O fenômeno pelo qual o Judiciário passou a ser demandado para solução de conflitos políticos compreende o poder de intervir em políticas públicas implementando os direitos assegurados na Constituição que a arbitrariedade ou a omissão do Legislativo ou do Executivo insistam em negar.
Mas não se pode confundir o fenômeno da judicialização da política com a politização da justiça. Em passado recente, um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), em ato falho, disse ser o líder do governo do Supremo. Se no Judiciário há partidários ou opositores de governos, isso implica em violação ao princípio da separação dos poderes e não pode ser confundido com o poder de fazer prevalecer as leis.
* Cientista político e membro da Associação Juizes para a Democracia