Juiz promete implantar mudanças no setor prisional da cidade e diz que vai fazer valer o direito dos presos
No comando do setor de execução penal de Joinville desde a última segunda-feira, quando deixou a 2ª Vara Criminal para assumir a 3ª Vara Criminal – ligada a processos de presos e assuntos de interesse ao sistema prisional –, o juiz João Marcos Buch promete ser o primeiro magistrado a continuar no setor por tempo suficiente para implantar mudanças em Joinville.Sua primeira ação foi autorizar o banho de sol imediato aos presos recém-chegados, que tinham de esperar dez dias para ter o benefício. Até o fim do ano, João Marcos Buch também quer ver todos os presos condenados em espaços separados dos apenados provisórios (cerca de 400 presos continuam no Presídio Regional, enquanto deveriam estar na Penitenciária Industrial).
Em relação aos presos do regime semiaberto, que ainda não têm acesso a trabalho fora da prisão, Buch avisa: “Se o Estado não fornece essa possibilidade a quem tem direito, a pessoa terá o direito de ir para a casa e permanecer lá”.
Outra medida considerada urgente pelo juiz é a instalação de bloqueadores de sinal de celular. O novo titular da 3ª Vara Criminal também confia na formação de parcerias para garantir ocupação aos cerca de 1.050 detentos do Presídio Regional. “As pessoas conhecem o trabalho do Judiciário por meio da minha atuação. Acredito que, com o meu nome, posso buscar a participação da iniciativa privada.”
A Notícia – O que o levou a assumir o setor de execução penal?
João Marcos Buch – Acompanhei o surgimento da 3ª Vara Criminal e o histórico do Presídio Regional quando tinha cerca de 400 detentos e ainda não existia a penitenciária. Acompanhei essa evolução estrutural e percebi o declínio do tratamento lá, superlotação e falta de estrutura. Percebi que isso precisa de um trabalho continuado. Conheço bem o sistema e tenho noção de como as coisas são difíceis de resolver, mas penso que vou conseguir trazer muitos ganhos na minha atuação.
AN – Até que ponto o Judiciário pode interferir no funcionamento interno do presídio?
João Marcos – O juiz de execução penal pode determinar tudo o que visa a preservar o direito do preso. A restrição a direitos como o banho de sol e a alimentação estão dentro da alçada do juiz, que preserva o direito do preso com ordens judiciais. É fazer a lei ser cumprida. Se não houver a implementação de um programa de saúde dentro de um prazo, por exemplo, pode-se permitir a prisão domiciliar.
AN – O senhor já determinou a liberação do banho de sol sem necessidade de triagem. Há outras medidas imediatas?
João Marcos – Elas não serão imediatas, porque também não se pode exigir milagres. Mas existem duas situações que teremos de ver: a separação do preso provisório do condenado (há cerca de 400 condenados no presídio, que deveriam estar na penitenciária) e também o direito ao preso que está em regime semiaberto efetivamente ficar em regime semiaberto. A abertura de vagas na nova ala (176) vai solucionar um pouco. Mas há pessoas presas, com direito ao semiaberto, que ficam fechadas 24 horas por dia sem acesso a trabalho, a absolutamente nada, como se fosse um preso preventivo.
AN – Na prática, como isso será feito?
João Marcos – O Estado terá de se preparar. Basta fazer um jogo de xadrez, viabilizar a separação dos presos. E, na questão de vagas do regime semiaberto, o Estado precisa se preocupar porque não podemos viver um faz de conta. Existem precedentes pacíficos em tribunais superiores de que, se o Estado não fornece a possibilidade do regime semiaberto a quem tem direito, essa pessoa terá o direito de ir para casa. O Estado terá de assumir essa responsabilidade acredito que até o fim do ano.
AN – A hipótese de condenados do regime semiaberto cumprirem pena em casa, se for necessário, não é descartada?
João Marcos – Não é descartada.
AN – Será imposta uma nova portaria restringindo a lotação máxima no presídio?
João Marcos – A princípio, não haverá portaria. Vamos tentar resolver com diálogo, porque todos nós fazemos parte do Estado e temos de nos comunicar. Mas pode chegar ao ponto de haver necessidade de uma portaria. Só que espero resolver com diálogo.
AN – O que será feito para agilizar os processos dos presos?
João Marcos – Já existe a perspectiva da instalação de um escritório modelo de faculdade de direito dentro de um mês. Estudantes vão trabalhar para encaminhar os pedidos dos presos. Será fundamental. As universidades também podem ter outros convênios psicológicos, de saúde. Não só doando seus serviços, mas proporcionando aos estudantes um campo vasto em seus trabalhos.
AN – É possível implantar oportunidades de trabalho dentro do presídio?
João Marcos – É possível. O projeto que imagino, com o apoio das entidades privadas, é de que seja feito um espaço dentro do próprio presídio para o trabalho. Talvez não atividades de mão de obra qualificada, mas trabalhos com mão de obra artesanal, uma ocupação. Algo que todos aprendam em alguns dias.
AN – O que pode ser feito para impedir a entrada de celulares na unidade?
João Marcos – Não existe justificativa plausível para o governo do Estado ainda não ter instalado um bloqueador de celular no presídio. O sistema não é caro e há de se pensar na urgência. Pessoas estão comandando o crime lá de dentro, programando fugas. Até 50% ou mais dos problemas de crime organizado dentro do presídio estariam eliminados. Ao Judiciário existe a possibilidade de, pelo menos, representar ao Ministério Público alguma ação civil pública.
Fonte: Jornal A Notícia de 18/03/2012 (http://www.clicrbs.com.br/anoticia/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a3697973.xml&template=4187.dwt&edition=19207§ion=2003)