segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O apoio do cinema na prisão, por João Marcos Buch*

- Tomara que seja um filme de aventura – era o detento José (fictício), aos 21 anos, preso por tráfico, aguardando o final do dia chegar para poder, com outros detentos de bom comportamento, assistir na sala adaptada a uma sessão de cinema. Alguns de seus companheiros de cela preferiam drama, outros comédia... Mas todos estavam ansiosos pelo filme. À parte todos os graves efeitos que a restrição da liberdade causa, a execução penal precisa proporcionar condições para a harmônica integração social do reeducando, de forma que quando ele retornar à sociedade, depois de cumprir sua pena, assim o faça comprometido com a paz e o respeito à lei.
Isso não é simples, mesmo para quem está livre. E na prisão demanda muito mais empenho dos profissionais que atuam no sistema. Lição antiga, um dos caminhos é a ocupação da mente. A troca de momentos carcerários ociosos por trabalho, estudo e cultura proporciona o resgate da autoestima do reeducando e o desenvolvimento de sua capacidade crítica, condição fundamental da civilização.

Neste ponto, o cinema é uma das possibilidades, pois, assim como o livro, é um eficaz meio para contar histórias. Como registrado na obra Salve o Cinema – Leitura Crítica da Linguagem Cinematográfica, coordenação de Fabio Henrique Nunes Medeiros e Taiza Mara Rauen Moraes, os filmes permitem desenvolver diálogos, reconstruir momentos históricos e fortalecer relações pessoais e sociais. Ou seja: o cinema é uma importante ferramenta de auxílio didático (Modro, Nielson Ribeiro. Cinema no Ar).

Levando isso em consideração, a portaria judicial nº 22, de 13/8/13, instituiu o Projeto Cinema na Execução Penal em Joinville. Por ela, o reeducando com bom comportamento poderá participar de sessões de cinema dentro da unidade prisional, assistindo a filmes previamente selecionados e catalogados pela direção.

É preciso sempre buscar despertar o que há de melhor no ser humano, sua capacidade de pensar, de adquirir consciência crítica sobre a vida e suas vicissitudes, de forma que possa desenvolver a ética (inspiração do filme Hanna Arendt, que recomendo). O cinema é mais um passo para isso. É uma forma de arte que também, se bem aproveitada, resgata e dignifica o homem, estando ele preso ou livre. Em última análise, é a arte a serviço da liberdade, no seu mais profundo significado humano. Boa sessão, José.

*JUIZ DE DIREITO DA EXECUÇÃO PENAL, CORREGEDOR DO SISTEMA PRISIONAL DA COMARCA DE JOINVILLE E MEMBRO DA ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA


Fonte: Jornal A Notícia de 31/08/2013