terça-feira, 3 de novembro de 2009
Manifesto
As entidades abaixo nomeadas vêm a público repudiar veementemente os atos de tortura cometidos contra detentos no Complexo Prisional de São Pedro de Alcântara/SC, noticiados pela Imprensa no último domingo, dia 01 de novembro.
As denúncias de reiterado desrespeito aos mais elementares direitos dos presos revela que não se trata de um mero desvio de conduta de agentes prisionais, mas de verdadeira política penitenciária instituída no Estado de Santa Catarina, na mesma linha de outras unidades da Federação.
Lamentável que esses bárbaros crimes venham sendo cometidos justamente no interior de órgãos que são responsáveis pela ressocialização dos detentos, o que demonstra a falta de compromisso institucional com a observação das normas legais.
O combate à criminalidade não pode ser feito por meio da violência, brutalidade e truculência, pois dessa maneira o Estado reproduz o modo de agir que deveria sancionar.
O art. 5º, inc. XLIII da Constituição Federal determina que a prática de tortura é crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia, “por ele respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.
A sociedade catarinense não admite que em nossas prisões ainda seja cometida tortura e exige que sejam tomadas as medidas cabíveis das autoridades competentes quanto a esse episódio, assim como ficará atenta à política de segurança pública, pois o respeito aos direitos humanos se faz com a participação de todos os cidadãos.
Entidades:
Defensoria Pública da União em SC
Assistência Social Diocesana Leão XIII
Cidadãos:
Bruna Maria Maresch - Estudante de Direito/UFSC
Gabriela Jacino
Marilia Montenegro Pessoa de Mello - Professora de Direito Penal e Criminologia da Universidade Católica de Pernambuco, Mestre em Direito pela UFPE e Doutora em Direito pela UFSC
Maurício Brasil - Juiz de Direito/BA
Paola Lorena Pinto dos Santos - Estudante de Direito/UnC
Ronaldo Sindermann - Advogado
André Dias Pereira - Defensor Público
Kenarik Boujikian Felippe, juiza de direito da 16ª Vara Criminal, SP, co-fundadora da Associação Juizes para a Democracia
Jorge Luiz Souto Maior – Professor da Faculdade de Direito da USP
José de Alencar - Juiz do Trabalho/PA
José Eduardo R Chaves Jr – Juiz do Trabalho/MG
Milton Lamenha de Siqueira - Juiz de Direita da Vara Criminal de Pedro Afonso-TO
Dora Martins - Juíza de Direito/SP
Sônia das Dores Dionísio – Juíza do Trabalho do ES
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
Qual notório saber jurídico?
A Constituição Federal é conhecida como Carta Política, porque organiza o Estado Brasileiro, faz a distribuição do poder e estabelece as diretrizes que nortearão a produção das leis e demais regras de conduta. Por conseqüência, o controle de constitucionalidade dos atos normativos é uma atividade eminentemente política, conquanto exercida pelo Poder Judiciário, em especial pelo Supremo Tribunal Federal.
Percebe-se que ao STF foi atribuída uma parcela de poder decisiva na organização das relações sociais, de modo que suas decisões têm repercussão direta na vida dos cidadãos, como ocorreu, por exemplo, no caso das pesquisas com células tronco.
Nesse quadro, é de se concluir que a nomeação dos ministros que comporão essa Corte é ato do maior interesse de toda a sociedade. O art. 101 de nossa Constituição determina que a nomeação cabe ao Presidente da República, depois de aprovada pela maioria absoluta do Senado, e estabelece três requisitos ao indicado: ter mais de 35 e menos de 65 anos de idade, notório saber jurídico e reputação ilibada.
Conquanto seja fato consumado, a nomeação do Advogado Geral da União José Antônio Dias Toffoli para ocupar a vaga do Ministro Carlos Alberto Direito reascendeu o debate acerca dos requisitos para integrar o STF.
Todavia, antes de discutir as várias propostas de alteração dos critérios, é importante questionar se os requisitos atualmente vigentes foram respeitados, pois não adiantaria estabelecer novas regras que também não serão cumpridas.
Dentre outras objeções, afirma-se que o novo Ministro não teria notório saber jurídico.
É senso comum que esse requisito consistiria no domínio da técnica jurídica, ou seja, o profundo conhecimento dos institutos dos vários ramos do direito, em especial, o constitucional. Observe-se que o saber jurídico deve ser notório, portanto, não basta que o Presidente da República ou seu grupo político tenham conhecimento desse domínio. Toda a sociedade deve ter provas de que o saber jurídico do indicado é notório, de modo que seus entendimentos sejam os mais explícitos possíveis.
Isso porque as decisões judiciais não são somente técnica, mas também envolvem um grau controlado de discricionariedade, ou seja, dentre várias hipóteses apresentadas, o juiz deve escolher uma e fundamentar, por meio da técnica, os motivos que determinaram sua escolha.
Assim, é perfeitamente possível, e até frequente, que dois indivíduos com profundo conhecimento da técnica jurídica profiram decisões em sentido totalmente opostos. Exemplos nesse sentido são colhidos diariamente nas sessões do próprio STF.
O fato é que o domínio da técnica é acessível a todos aqueles que se dedicarem com afinco ao estudo e à prática dos institutos jurídicos. Todavia, por si só, essa condição não é suficiente para indicação a uma vaga na mais alta Corte do país.
É fundamental que a sociedade conheça a postura ideológica dos indicados. O perfil conservador ou progressista de um Ministro influenciará o destino de todo o país, com consequências que serão sentidas por anos ou mesmo décadas.
Foi com o objetivo de possibilitar à sociedade o controle sobre essa postura ideológica que a Constituição exigiu do indicado notório saber jurídico.
A verificação desse perfil, por sua vez, é aferida pelo histórico profissional e pela produção doutrinária do candidato. A atuação profissional vai revelar os interesses aos quais ele esteve vinculado durante sua carreira, que certamente influenciarão na formação de suas convicções. A produção doutrinária explicita tendências e permite identificar os valores que norteiam sua conduta.
Nessas circunstâncias, será possível exigir coerência nas decisões do indicado. O que não se pode admitir é que seus posicionamentos não sejam conhecidos pela sociedade e pelo próprio meio jurídico, pois sua postura será uma verdadeira incógnita.
Infelizmente, esse foi o caso do Ministro Dias Toffoli.
Pela carreira meteórica, é provável que ele seja profundo conhecedor da técnica jurídica, entretanto, não tem produção doutrinária e sua atuação profissional esteve restrita a âmbitos que não permitiram publicizar seu pensamento. Assim, não é possível averiguar seu perfil ideológico.
Torcer para que o novo Ministro não seja vetor de retrocessos é o que resta à sociedade brasileira, papel pouco relevante em um Estado que se pretende Democrático de Direito.
O mais grave é que essa torcida se estenderá por longos 28 anos, constatação que revela quão urgente é a discussão acerca da PEC 342/09, que estabelece mandato de 11 anos para os Ministros do STF.